23 Guerreiros

11/12/2012

克服する Emerson Sheik 克服する 23 Samurais 戦士 Guerreiros Do Mundial 2012

 

 

 

 

“Quanto mais difícil, quanto mais provocam, mais eu gosto.
É nesses momentos que as coisas acontecem na minha vida”

– Eu falo o que eu faço, falo o que vem na minha cabeça, o que me dá vontade, o que acho certo. Não faço cerimônia pra falar porra nenhuma.

Ele é herói e anti-herói. É Emerson, é Marcio e é Sheik. É malandro e doce. Morde (literalmente) e assopra. É polêmico e religioso. É dos samurais de infância mais miserável e dos poucos que concluíram os estudos. É amante da leitura, amante da vitória, nem que para isso…

– Se tiver de ser na porrada, vai ser na porrada o tempo todo.

Marcio Passos de Albuquerque nasceu em 1978. Mas, para tentar a sorte no São Paulo, em 1997, adulterou nome e data de nascimento. Despontava, então, o Emerson, desmascarado em 2006 ao tentar embarcar para o Qatar, fruto da chantagem de um empresário, que queria dinheiro para guardar seu segredo. Na Arábia surgiria o Sheik, apelido que pegou a ponto de virar quase um terceiro nome. Hoje, ele é Marcio para a família, foi Emerson ao batizar o filho Emerson Junior, e é Sheik para os milhões de corintianos que o idolatram mais e mais, sobretudo após os dois gols na final da Libertadores.

Seja qual for o nome, a alma é uma só, criada pela mãe Carmem, com ajuda dos irmãos mais velhos Claudio e Lígia, em meio à pobreza de Nova Iguaçu, município do Rio de Janeiro. Ele define sua infância e adolescência de forma bem prática:

– Eu tinha menos que nada. Passei fome, sem roupa, sem expectativa alguma de um futuro melhor.

Por isso peitou a mãe, que sempre foi contra a falsificação. O início promissor no São Paulo o impediu de contar a verdade, por mais que a vergonha já tomasse conta de sua mente. Medo de voltar aos tempos em que só tinha um uniforme para ir à escola todos os dias, e jogava futebol nas ruas da favela com dois chinelos como traves, e uma cabeça de boneca como bola.

Adolescente, Marcinho, como era chamado por dona Carmem, chegou a trabalhar como auxiliar do padrasto, pedreiro, além de ajudar a fazer pães. Emprego que não deu certo, já que ele dormia na padaria e comia sua toda sua obra-prima. Mais fácil do que ganhar seu dinheirinho era o acesso às drogas. Quatro ou cinco amigos até já morreram. Mas o jogador jura nunca ter encostado um dedo em qualquer tipo de “besteira”.

– Minha mãe saía para trabalhar de manhã e só voltava à noite. Nós ficávamos muito expostos, próximos de tudo, mas felizmente sempre optei por outros caminhos. Aquele era meu mundo, mas nunca tive interesse.

Marcio foi levado ao São Paulo pelo irmão do ex-lateral-direito Cláudio Guadagno, e único aprovado num teste com mais de 400 jovens. Exalando confiança, deitou e rolou nas categorias de base (três anos mais velho do que a maioria dos parceiros e rivais, em razão da documentação alterada), até ser convocado pelo técnico Pita, que fora seu comandante e tapava buraco no time profissional, em mau momento, para estrear no Morumbi.

Ele admite que, na época, nem sabia mais direito como se chamava. Marcinho, Emerson, Carioca… Valia tudo. Mas nem isso nem a pressão de atuar ao lado de jogadores como Raí e Jorginho, que mais “admirava” do que pensava em tabelar, e muito menos o fato de a estreia ser contra o Flamengo, time do coração, o deixaram com medo. Medo, aliás, não consta em seu dicionário, ao menos em campo.

– Nunca tive medo de desafios. Tive medo de morar na favela, de uma bala atingir minha cabeça ou de um bandido entrar na minha casa fugindo da polícia.

Àquela altura, ainda sem um salário dos mais robustos, o jovem já havia construído uma casa nova para a mãe, em Nova Iguaçu. A cidade não saiu de seu roteiro e a cada visita o caso com uma vizinha de barraco ficava mais quente. Não havia namoro, mas havia sexo, e de um descuido nasceu Kevin. A notícia da gravidez deixou Marcio envergonhado perante a mãe, preocupado diante do futuro e sem o quarto novo, que passou a ser da moça.

Kevin, hoje, tem 14 anos, e vive em meio ao fogo cruzado de pai e mãe. O jogador, recentemente, exigiu que o garoto, que mora no Rio, tivesse um telefone para terem contato mais fácil. Ainda não é o suficiente.

– Só não dou mais carinho porque a mãe acha que não tenho de vê-lo tanto. Queria ser mais presente na vida dele.

Foram muitas emoções mesmo durante a passagem pelo São Paulo. O reencontro com o pai, Aladir, é considerado presente de Deus. Na adolescência, ele rejeitara o homem que largou a esposa com três filhos pequenos, na miséria, para viver com outra. Mas, depois, foram juntos até à balada. Tempo para ver que o “coroa” era boa gente. Pouco tempo. Aladir faleceu em 1999, enquanto o filho defendia a seleção brasileira sub-20 em Portugal. Quando ele soube, o pai já estava enterrado. Ficaram em paz, os dois.

Em cinco anos no Japão, Emerson ganhou bom dinheiro e estudou, motivado pelo medo de não conseguir se expressar bem em uma entrevista. Ele recrimina fortemente os boleiros que alegam falta de tempo para aprender. Mais tarde, graças à esposa Thaise, também virou fã de literatura.

O caminho seguiu em gramados pouco gloriosos. Do Japão para o Al Sadd, do Qatar, onde virou quase sheik de verdade: passaporte do país e carros caríssimos de presente. Ele só não podia beijar a esposa, Thaise, em público, que a polícia era chamada. Problema pequeno perto do que passaria depois, detido no aeroporto quando a adulteração veio à tona. A pena, já convertida, o obrigou a prestar serviços a comunidades carentes.

Emerson voltou, foi campeão no Flamengo e no Fluminense, onde cantou uma música do time do coração e foi afastado. Sua prioridade era permanecer no Rio, perto dos filhos mais novos Junior e Henrique, mas o projeto, a história e o fanatismo da torcida do Corinthians foram essenciais.

– Meu empresário (Reinaldo Pitta) falou o seguinte: “Você já tem dois títulos brasileiros seguidos. Agora vai para o Corinthians, ganha de novo, e depois é campeão da Libertadores. Acabou!”. Foi uma brincadeira, mas séria (risos).

A identificação com a torcida alvinegra foi quase instantânea. Algo meio enlouquecedor, passional, malandro. Em cada ato, como na mordida que deu na mão do zagueiro Caruzzo, do Boca Juniors, na decisão no Pacaembu.

– Eu tava muito p…, queria dar um soco na cara dele. E ele queria muito me bater, mas não podia, então empurrou minha boca, mas, para azar dele, o dedo caiu na minha boca. Coitado… Doeu porque eu mordi com muita vontade. Fiquei com dor no dente depois.

Emerson está solteiro. O apelido de Sheik o incomoda bastante quando indica que há mulheres num harém. Ele é muito seletivo, tem facilidade para fazer amizade com elas sem segundas intenções, mas admite estar em busca de uma namorada. Que características as pretendentes devem apresentar?

– Não precisa ser bonitona ou gostosona, tem de ser carinhosa, honesta, correta e independente.

Honesto e correto. Termos que ele enfatiza, principalmente para negar que tenha ligação com contrabando e lavagem de dinheiro, num caso de compra de automóveis importados ilegalmente.

Marcio Emerson Sheik pode não viver das suas melhores fases no Timão, mas já superou tanta coisa, e escolheu justamente a superação como palavra-chave de sua trajetória, que segue como principal aposta para a estreia desta quarta-feira, contra o Al-Ahly. Nada melhor para completar uma história tão cheia de nuances do que o homem que tinha menos que nada, de repente, passar a ter o Mundo.

– Estou muito ansioso comigo mesmo. Tenho visão de jogo, gosto de entender o que está acontecendo na partida, vou pra cima, vou tentar furar, tentar passar. Eu me sinto responsável quando vejo o trabalho do Tite, da diretoria, do menino que faz nosso pão. Eu sei que não vou resolver sozinho, mas preciso resolver e me cobro isso.

 

 



Sobre o Autor

Pablo
Coordenador de Suporte, Governador da República Popular do Corinthians e Louco pelo Timão!




Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.